Raduan Nassar escreveu apenas dois romances em sua vida, já que desde 1984 decidiu parar de escrever e passou a se dedicar à vida no campo. Mas apesar de uma produção literária tão pequena em termos de páginas escritas, seu trabalho é tão impactante que deixa mais do que justificado o seu papel de destaque na literatura nacional. De fato, a leitura de Lavoura Arcaica deixa marcas no leitor e revela a invejável afinidade que Raduan tem com as palavras.
A obra, publicada em 1975, traz a história de André, nascido em uma família rural numerosa, mas que decidiu abandonar sua casa e se mudar para uma cidade do interior. No entanto, os motivos que o levaram a tomar essa decisão não são revelados logo de cara.
Já nas primeiras palavras, o leitor se deparada com um forte tom poético que vai estar presente ao longo de toda a obra. André é o narrador personagem e, logo nas primeiras cenas, somos apresentados ao seu irmão, Pedro, que faz uma visita para tentar convencê-lo a voltar para casa. A partir disso, os capítulos vão se alternando entre os diálogos dos irmãos com as memórias do autor, revelando, aos poucos, a fonte principal dos conflitos internos do personagem e que o levaram a decidir abandonar a família (paro por aqui, para evitar spoilers). Mas já adianto que é uma temática incômoda e que divide espaço com a escrita IMPECÁVEL de Raduan. A sensação é de que nenhuma palavra está lá por acaso.
Por fim, não dá para deixar de dizer que, apesar de encantadora, a escrita não é das mais fáceis. Além de se valer de inúmeras metáforas, o autor utiliza muito a técnica do fluxo de consciência. Ou seja, nos coloca nos pensamentos – confusos e não lineares – do narrador. Você inicia um capítulo e se vê atirado nesses pensamentos, que não terminam até o final do próximo capítulo (vários com apenas um ponto final!). Haja fôlego, mas o esforço é compensado por cada palavra lida.
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