O título da obra já antecipa a estrutura que Benedetti, um dos maiores nomes da literatura uruguaia, usou para construí-la: um romance fragmentado. São 75 pequenos capítulos, denominados de andaimes pelo autor, que têm como tema principal o regresso de um cidadão uruguaio para sua terra natal depois de mais de 10 anos de exílio.
O leitor acompanha o processo de “desexílio” do protagonista, Javier. A experiência de voltar para um país que não é mais o seu da forma como conhecia. É a sensação não só de se sentir um estranho no lugar onde nasceu, mas também de encontrar amigos e familiares que não são os mesmos. A ditadura deixou marcas e quem deixou o país a sentiu de outras formas. E, na minha opinião, esse processo do retorno abordado pelo autor transforma “Andaimes” em uma obra interessantíssima e pouco comum.
Além disso, os capítulos seguem padrões distintos: há cartas, poemas, memórias, sonhos, diálogos… a forma é livre, assim como a cronologia. O que no começo pode deixar o leitor um pouco confuso, acaba se revelando um estilo muito rico e que transmite a ideia de “construção” da narrativa. Não espere grandes acontecimentos, já que o texto apresenta uma carga mais subjetiva, dos impactos causados na vida de Javier e das pessoas a sua volta.
O protagonista deixou família Uruguai e, muito anos depois, acaba fazendo o mesmo ao retornar ao seu país natal. A relação com sua mãe e com sua ex mulher acaba deixando a obra menos política e nos envolve com a leitura. Não amei o final, mas consegui fazer as pazes com a escolha do autor – sem mágoas.
Enfim, uma belíssima obra sobre memória, identidade, reconstrução e mudanças. Gostei muito e acabai lendo na sequência “A trégua”, do mesmo autor (que será objeto de uma outra resenha). Recomendo muito, mas com a observação que é uma leitura com um ritmo um pouco mais lento!